SERÁS COMO UM JARDIM REGADO Is 58,11

18/05/2011 09:47

 A vida é uma grande feira, poetou Fernando Pessoa. Nas Escrituras releio e rumino a vida como jardim. Jesus nos lembrou que o Pai às vezes é como um agricultor, sabe da hora boa de podar. Jesus ressuscitado foi ti do como um jardineiro por Madalena.

 

Nos jardins da Trindade

Do jardim das aflições ao futuro de nós todos nos céus de Deus. Será, considero, como estar num jardim de delícias: fontes, árvores de toda espécie, pássaros, mesa posta, andanças, encontros e reencontros. A novidade das realidades plenas, sem dores. A vida como paisagem: nós e os outros todos. Espaço de total proteção, livres do desamparo. Só amores.

Senti mentos. Tudo revelado. Nenhuma nudez envergonhada. Vestidos de luz. Sem artifícios. Não há noite. A beleza e doçura da paisagem de fora se confundindo com as paisagens de dentro. Não há doenças a se curar; doenças da alma inexistem. Uma história de amores sem fim; historia feliz.

Volto a citar Fernando Pessoa e suas metáforas. Vejo-as realizadas nos encontros divinos; nos céus de Deus, jardim de delícias, e nós todos lá: - Quando te vi, amei-te já muito antes.

 

Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci para ti antes de haver o mundo.

A paisagem brilha. É pura glória. “Olha a glória de Deus brilhando”. Jesus estará finalmente bem entendido: - Se vocês não se tornarem qual crianças...

Nosso olhar olhando as paisagens de todos nós com a Trindade dos divinos três, é olhar de crianças. Pura admiração e contentamento. Seremos, penso, quais crianças arti stas, poetas e músicos. Brinquedos e arte, melodias senti das. Arpejos. Nadinha de trabalhos onerosos nem horários estabelecidos.

Estaremos a salvo. Perfumes e cores. Cirandas. Sem cegueiras, vendo o que não se via. Sem feira de utilidades, agora inúteis. Terminou o tempo de aprendizes. Permanece a sabedoria e o saber. Todos vitoriosos, como se houvéssemos, ao mesmo tempo, rompidos juntos com as barreiras.

Só vencedores. Não há vencidos. Ao vencedor: ...um maná escondido, uma pedra branca, e gravado nela um nome novo. Ap2. 17. Lhe darei a estrela da manhã. Ap 2,28. Alegria, prazer, presença. Sem ausências. Todos os senti mentos humanos como canções de identidades harmonizadas no instante eterno. A linda vida divinizada; é tempo de eternidade, pois Deus não morre.

 

PENSAÇÕES

Essa torrente de pensações (= pensamentos e emoções) me irrigou quando lia Fernando Pessoa, estando sentado na relva do jardim aqui de casa, parte de dentro. E foram estas pensações desencadeadas porque no meio do jardim, entre lajotas, há uma árvore, a caramboleira. Quase quinze metros de altura. Dizem que pode viver até setenta anos. A caramboleira chegou ao Brasil, vinda da Índia, por Pernambuco. Esta aqui nos chega pelas gerações redentoristas por aqui passados. É parceira do calor. Suas flores são consumidas em saladas, na Índia. Suas folhas limpam manchas.

A carambola é fruto para variadas sobremesas, sucos, e drinques.

 

CARAMBOLA

Segui brincando de desmontar a palavra num jogo sem regras de semântica. Mergulhei num quase sonho, associando evocações e emoções. Livres associações como os sabiás bicam seus insetos e suas sementes, sem se importarem comigo por ali. O pé de carambola joga no chão seus frutos amarelo-verde-alaranjado, dependendo da maturação. Alguns se partem ao cair e deixam ver o desenho da estrela em sua carne agridoce (Golden star, dizem os ingleses). Um chão constelado de cores e interfaces dos cinco gomos. Mês após mês.

 

Carambola. CARAMBA!

Caramba foi a expressão primeira que soletrei rindo, surpreso. Demorei olhando admirado. E ficou translúcida a evidência: sem admiração não há como viver; não se fazem descobertas. Quem não se deixa tocar não se abrem horizontes para ele. Mirar é ser encantado. Encanto-me quando... (diga lá você, leitor(a)...).

Carambola. ORA, BOLAS

Bola. São tantos os jogos que fazem a vida rolar interligando, driblando adversidades, indo no mesmo rumo de muitos outros... rumo da alegria de dar certo. A bola: o redondo das gentilezas, do agradecimento, da reciprocidade alegre, do ir em direção ao outro, dos passes recebidos. A vida como um jogo livre de poder dizer e saber dizer ora SIM ora NÃO. Não é por nada, mas há mesmo gente que sabe bater um bolão.

Felizes esses...

 

Carambola. CARA

Cara vida, querida vida. Pessoas queridas a quem destinamos nosso amor. A vida nos é querida. Querido Deus, exclamava Geraldo Magela. Se perco Deus, me perco também.

Queridos amigos leitores a vocês, a cada mês, estas crônicas de um caminho no Espírito. Espiritualidade redentorista.

De cara com a vida, sem medo de como ela é. De como nos chega. Sem escamotear suas intensidades, as doídas e as perfumadas e as... . Você, leitor (a), aprecia o cara a cara, olhar nos olhos? Ah, o rosto e as histórias nele inscritas. Gravações que não se apagam, que nos olham e que precisamos aprender a olhar. Primeiro em nós mesmos!

Velando pelo rosto dos outros, como companheiros, parceiros, fraternos ... haja tempestades ou luar. – Ô cara, quanto tempo! E aquele abraço. A distância se faz proximidade e a gente mata juntos a saudade. Isso é que é cumplicidade. Cara cumplicidade.

 

Carambola. EMBOLA

Como a vida embola quando os senti mentos pululam e alguns deles são como ovos de serpente quebrando a casca, rompendo o silêncio repressivo.

Põem-se estes a mover embolando. Que embolada, santo Deus! Selvageria interior e até exterior ao pisarmos duro, maldizendo, atirando gestos e palavras venenosas, assustando e ferindo gente querida até. É tremendo o poder do mundo desconhecido de nossas profundezas, quando a gente não sabe de si. Embola.

 

Carambola. EMBORA

Ir embora. Chega hora de dizer “adeus”. Despedir-se é desprender como os frutos se desprendem da árvore. Partir. Ir em parte. Deixar ir. E permanecer, seguindo . As carambolas caem, mas a caramboleira permanece. Muito embora já tenha dito muitos “adeuses”, concluídos tantos lutos, sempre dói. Dói geral. O coração fica assim apertado, até que bate bom ritmo por saber a importância de partir e dizer “adeus”, pois é quando o amor rejuvenesce. Incrível. Só quem perde se salva. Os ritos de despedida

são transformações de vida. Novas promessas vão desabrochar, novos frutos virão. Amor e separações.

Superações amorosas.

Nosso pé de carambola , a caramboleira, árvore de vida plantada no meio do jardim , agora está folhuda em tons verde-escuro e as pequenas flores brancas e vermelhas se entremeiam. Apenas o vento forte sacode e eriça os ramos. À noite, uma sonata de outono se ouve tocada pela brisa passando por entre as folhas.

E rumino o Salmo 1:

Será como a árvore que dá fruto em sua estação, e sua folhagem não murcha.

Vitalidade.

E ainda recordo: Um rio de água viva, brilhante. No meio da praça e nas margens cresce a árvore da vida, que dá frutos doze vezes, cada mês em colheita, e suas folhas são medicinais.

Ap 22,1-5.

 A caramboleira vive somente uma vez. Nós também.

 Pe. Dalton Barros de Almeida, C.Ss.R

Coronel Fabriciano, MG